"Na vingança e no amor a mulher é mais bárbara do que o homem"
Friedrich Nietzsche
#53
Coelhas
Noite em Sistinas, aquela cidade que fica mais e mais interessante conforme as horas avançam pela escuridão. Num cruzamento pouco iluminado de avenidas, o solitário motorista percebeu que o carro ao lado estava recheado de mulheres:
— Onde as gatinhas estão indo?
— Não é da sua conta, macho. - respondeu a negra, da janela do banco de trás.
— Não seja grossa, ele é gato. - disse uma segunda voz, também no banco traseiro.
— Gato, porém intrometido. - observou a motorista, inclinando a cabeça sobre o volante para analisar melhor o cara.
— Detesto macho que não sabe guardar o pau dentro da calça e fica enchendo meu saco. Gato ou não.
— Olha só... uma, duas, três, quatro... cinco gatinhas! Tão indo pra onde?
— Cara, para de falar "gatinhas". Parece meu tio falando, sei lá. - resmungou o mulherão sentado ao lado da motorista.
— Que gatinha mais arisca... Qual é a boa pra hoje?
— Puta que me pariu...
— Esquece ele, Roger. Farol vai abrir.
— "Roger"? Peraí... você é um traveco?
— Caralho Coelho Branco, eu já disse: nada de nomes verdadeiros!
— Ei grandona, você é linda mesmo sendo traveco. Deve dar um puta trabalho na cama. Pena que não curto. Boa noite e bom rolê pra vocês aí. Fui!
O farol abriu e ele disparou, cantando pneus pela noite amarelada. As cinco se entreolharam:
— Que merda foi essa? Será que ele sabe que escapou de levar uma surra?
— Seria um excelente aquecimento, né? Desculpe soltar seu nome, Pernalonga. Na verdade, eu ainda não decorei direito e...
— Relaxa. Mas que não se repita. Pelo menos decorou O SEU codinome?
A motorista albina, "Coelho Branco", sorriu primeiro com a boca, depois com o olhar também.
— Eu ainda não estou acreditando que vamos fazer isso, meninas. - disse a loirinha encolhida atrás da motorista.
— Precisamos fazer. - respondeu a negra - Por você, por nós e por todas as minas que sofrem na mão desses machos escrotos!
As cinco Coelhas se movem pelas ruas, ligadas por um sentimento em comum: vingança. Cada uma delas tem uma história de violência cujas cicatrizes as unem em torno de um único propósito: dar o troco.
— Lebre Maluca, você que é nosso departamento de inteligência... Tem certeza que nosso alvo tá trabalhando até tarde?
— Ele acaba de atualizar o status usando a hashtag #entediadonotrabalho. - respondeu a gordinha sentada entre a loira e a negra. Dedilhava um celular bem perto do rosto, que deixava suas bochechas azuladas.
— Pois vamos acabar com o tédio dele, manas.
Jason espera impaciente enquanto a máquina da recepção despeja seu quarto copo de café expresso. Detestava café processado, mas como a recepcionista que sabia fazer café de verdade estava de folga, era com a máquina que tinha que se virar até o fim do seu horário. Sozinho no trabalho, ainda faltavam longos quarenta minutos pra ir embora. Impaciente, levou o copo plástico aos lábios e assim que sorveu sentiu o café queimar sua língua.
— PORRA! Que merda! - soltou o copo ainda cheio no piso e o chutou longe, irritadíssimo. Já pensava numa desculpa pra deixar o chão sujo pra tia da limpeza se virar na manhã seguinte, quando viu uma silhueta orelhuda do lado de fora da porta.
— Ei, vaza...? Sai fora!
A silhueta permaneceu lá. Até acenou para ele.
Jason era um cara rude, grosseiro. Caminhou até a porta, gritando: "Tá fechado. Volta amanhã!". Quando girou a maçaneta para expulsar quem quer que fosse, se deparou com uma loira muito "simpática de corpo", que o encarava usando uma máscara de coelho dourada brilhante que cobria o nariz, olhos e a testa, terminando em orelhas imensas e irregulares. Parecia feita daquele material metalizado de balões de criança e dava um ar festivo bizarro à moça.
— Oi Jason. Estava passando e...
— Tira essa máscara que não é Páscoa. Como sabe meu nome, quem é vo...?
— Ei calma, entre no jogo. - ela o interrompeu, carregando maciez na voz - Parece que é sua noite de sorte.
— Isso é coisa do Mitch, né? Ele que te mandou aqui?
— Na verdade, foi uma amiga minha. Uma ex sua, digamos. Ela me falou das noites quentes aqui, aproveitando que você trabalhava sozinho até tarde e...
Jason tentava descobrir de quem a Coelha falava. Transou muito ali. Teve mais mulheres do que podia contar, e ele achava que sabia contar bastante.
— Ah, moça, olha… até gosto dessa conversa, mas tô bem cansado, com preguiça de pensar. O que você tá fazendo aqui, afinal?
— Nossa, meio grosso né? - os lábios vermelhos e cheios sorriram, o atraindo - Me diz, você está muito... cansado? Ou acha que dá conta?
— Dou, dou sim. - ele a mediu da cabeça aos pés. - Ah se dou! Quem é sua amiguinha?
— Você pergunta demais. Por que não desliga as câmeras pra eu poder entrar?
— Desligar... deslig AH TÁ! Claro, claro. Mas, mas... por quê?
— Não se faça de bobo Jason, minha amiga me passou todo o esquema. Você sempre desligava pra ficar sozinho com ela. Mas se não quer, beleza.
— Tá, tá. Não se mexa. Espera. - Jason sentiu que, de repente, sua noite podia ser salva com sexo casual. Era como pedir pizza num lugar diferente pela primeira vez, e pizza mesmo quando era ruim era boa... Só não entendia o porquê daquela máscara de coelha, mas o corpo compensava demais aquela estranheza.
Quando voltou pra recepção a máscara ainda esperava a confirmação dele. Parecia um daqueles assassinos de filmes de baixo orçamento. "Dane-se se for brincadeira do Mitch, vou passar a rola e foda-se".
— Pronto, desliguei. Agora, posso segurar essas suas orelhinhas enquanto você...?
— Trouxe umas amigas... - ela interrompeu, a voz mudando de repente.
— Quê? Ei, não, espera... agora isso tá ficando esquisito. Não posso deixar gente estranha entrar aqui.
— Tá com medo, Jason?
— Escuta aqui sua esquisita! Some daqui agora ou vou te chutar pra fora! Não me obrigue, não sabe com quem está mexendo! - apontou o dedo e foi caminhando na direção dela de guarda baixa, sem esperar pela rapidez com que ela sacou uma espécie de lanterna e disparou um choque nele. A voltagem era fraca e não o machucou, mas enquanto se recuperava do susto, outra máscara de coelho pulou em sua direção e disparou um spray ardente a mais de 100km/h direto na cara dele.
— MEUS OLHOS! Sua filha da p... - ele gritou, enquanto o gengibre queimava também suas narinas. Caiu no chão, piscando, esfregando o rosto, agoniado. Enxergou outros vultos orelhudos invadindo a recepção, antes de levar outro jato no rosto.
— Agora vai pagar, seu merda! - a segunda coelha o chutou no saco com toda a força que tinha. Ele dobrou-se no chão em posição fetal, sentindo a dor das bolas subir até o estômago.
— Acho bom me acertar mais forte, sua puta. - tentou parecer durão, mesmo com a voz embargada - Quando eu levantar daqui vou acabar com vocês!
"Ah, mas quem disse que vai conseguir se levantar?" - disse uma terceira voz, mais grossa, à sua esquerda. Essa mesma voz lhe acertou um soco bem-dado na têmpora e ele sentiu tontura. Aquilo não lhe pareceu um soco de mulher. Engoliu a ânsia de vômito com o chute que levou na boca logo na sequência.
— Sente o gosto da minha bota, seu escroto.
Com enormes dificuldades para enxergar e respirar, Jason percebeu que estava com medo. Ouviu algo, um taco de beisebol sendo arrastado, à sua direita. Se encolheu por reflexo quando ouviu a madeira silvando pelo ar, e uma pancada forte explodiu em seu braço. Depois na sua perna. Não sabia quantas eram, mas brincavam com ele. Sua irritação aumentava ouvindo seus risinhos de deboche. Numa de suas piscadas, percebeu que o vulto de uma das orelhudas se mantinha afastada, próxima à porta.
— Suas putas fodidas, todas vocês... Acabou a brincadeira, acho bom fugirem porque eu...
— Lola? Frita ele. Só falta você.
A coelha negra chamada "Lola" era gostosona, rebolativa, cheia de curvas. Se abaixou e encostou o punho fechado no pescoço dele. Uma descarga elétrica absurda atravessou o corpo de Jason, travando todos seus músculos até ele desmaiar.
— Terminamos com ele?
— Sim, o cérebro de ervilha dele desligou. Esse palhaço vai acordar bem dolorido e...
— Espera, eu quero marcar esse babaca! - interrompeu "Coelho Branco". Ela sacou outro spray, misturado com violeta genciana, e borrifou o rosto inteiro dele. Depois chutou as pernas do homem caído até as afastar. Então deu três chutes raivosos, daqueles bem dados, todos no saco: "esse é por mim, esse é pelo meu namorado e esse é por nos chamar de putas fodidas!"
Lola abriu um sorrisão enorme:
— Esse vai ficar com a cara roxa por uma semana no mínimo. Bora pegar o próximo macho escroto, manas?
— Não, melhor não. - ponderou a voz grossa de "Pernalonga" - Sei que a adrenalina tá a mil, mas vamos administrar e curtir nossas vinganças. Vamos beber e desfrutar melhor desse momento.
— E planejar os próximos, claro. - completou a "Lebre Maluca" girando seu taco, eufórica.
O carro estava estacionado algumas quadras distante, a Lebre fez questão de checar se tinham câmeras ali, mas não encontrou nenhuma. A cidade era esquisita naquele aspecto, até atrasada; enquanto as metrópoles do mundo instalavam mais e mais câmeras para vigiar seus habitantes com a desculpa da segurança, Sistinas quase não tinha investimentos nisso, como se ninguém tivesse interesse em ver o que acontecia naquelas ruas.
Elas riam e se abraçavam quando entraram no veículo, mas Coelho Branco tirou a máscara e desabou no volante, chorando.
— Que foi menina? - Pernalonga perguntou ao seu lado, enquanto tirava a máscara.
— Mana, tudo bem? - quis saber Lola, já com o rosto descoberto também.
— Tô chorando, mas é de alívio. Aquele, aquele... IMBECIL... mereceu!
— Claro que mereceu, flor. Quer falar sobre isso? Tá precisando desabafar?
— Coloca pra fora, estamos juntas nisso. Ninguém aqui vai te julgar.
— Eu, eu... - ela tirou a mão do câmbio e enxugou o rosto.
— Olha, venha aqui pra trás ganhar amorzinho das meninas. Eu dirijo. Vou levar a gente pra beber num lugar legal. - se ofereceu a loirinha, a "Coelhinha da Playboy", já descendo do carro. Assumiu o volante e as levou direto ao ambiente mais panorâmico de Sistinas: o Aces High Bar.
Lá, muitos andares acima da cidade, a noite se abria diante delas. Ocuparam uma mesa no canto e se fecharam em círculo tão grudadas que até o garçom achou a cena bonitinha, destacando exclusivamente uma garçonete para melhor atendê-las.
— Não precisa falar se não quiser. É nosso pacto: você só abre se quiser. Estamos juntas, mas seria legal sabermos por que batemos naquele cara. - começou Pernalonga.
— É mana, mas se for algo muito traumático não precisa contar.
— Não, Lola, eu quero falar sim. - respondeu Coelho Branco. Suspirou, tomou um gole da bebida colorida que pediu e continuou:
— Eu namoro, quero dizer, namorava... namorei... um carinha que era um doce de pessoa. Sensível, romântico, apaixonado por animais e por mim. Depois de um tempo, para não cairmos na rotina, começamos a pensar em formas alternativas de sexo, sabe? Pra esquentar de novo a coisa. Não que o sexo fosse ruim, mas tava... burocrático. Eu mesma não me esforçava mais. Mas assim, fora do sexo tava tudo ótimo! Ele era um parceiro incrível, perfeito. Tanto que tomei coragem de propôr sexo a três.
— Sério? Você quis dar outra mulher de brinde pro seu macho?
— Calma lá, Lola, pelo contrário! Ele era um homem tão fantástico que não apenas topou o ménage como me encorajou a encontrar OUTRO CARA para transarmos. Tipo, ele pensou em mim primeiro! Nem pediu nada em troca, como geralmente acontece nesses casos. A maioria dos homens só quer duas mulheres, sempre.
Lola se esticou na cadeira e desabafou:
— É que eu, quando era burra, trouxe uma segunda mulher pra cama do meu homem. Quis agradá-lo tanto que "me dei" de presente pra ela. Usei lingerie vermelha e até enfiei uma rosa no rego! Fiquei de quatro na cama com aquela flor entre as nádegas, enquanto ela entrava vendada, de mãos dadas com ele. Ela era magrinha, sabe? Não tinha essa raba toda que eu tenho. Aí passou a noite me lambendo e dizendo que minha bunda parecia um coração enorme. Eles estão juntos até hoje, fui trocada por ela. Mas não sinto raiva dela não, só dele.
Todas fizeram silêncio com a revelação de Lola, até a Lebre Maluca perceber que era melhor voltarem ao assunto:
— Então Branquinha, você com dois caras na cama? Nossa, meu sonho de princesa! Nota mental: preciso criar um aplicativo específico para homens que queiram a três com outro cara. Cuckold ou não.
As outras quatro olharam pra ela, sem entender nada: "Cu o quê?"
— Relaxa gente, só divagando. Continue, continue, já te interrompemos demais.
— Bom... eu comecei a procurar outro parceiro pra gente. Passava a maior parte do tempo molhada só pensando na possibilidade. Até que encontrei. Não estava muito longe, era amigo de amigos nossos. Solteiro, mais forte que meu namorado, mas menos bonito, enfim, parecia interessante... Nos aproximamos e começamos a fechar o cerco. Certa noite eles foram beber sozinhos e foi aí que meu namorado, quer dizer, meu ex-namorado, abriu o jogo. E o convidou para transar conosco. Ele quis ver nudes meus. Meu namorado tinha alguns no celular e mostrou. E aí ele topou! Me senti a mulher mais desejada desse mundo.
— Não sei vocês, mas já fico tensa com um homem só... - comentou a Coelhinha da Playboy com seu corset impecável, os seios saltitantes e os ombros nus tatuados. Ela sempre parecia estar no meio de um ensaio fotográfico glamouroso. - Não confio mais em homens, jamais encararia dois.
— Mas por quê? Fazer sexo com outro na frente do seu namorado continua sendo sexo com seu namorado. Enfim... marcamos num sábado, saímos de rolê e combinamos de não exagerar para não estragar o resto da noite. Nos divertimos muito, rimos, cantamos, dançamos e chegamos razoavelmente sóbrios em casa. Eu fui direto pro banho e os deixei à vontade. Quando voltei para a sala, eles estavam nus, cada um numa poltrona, conversando acho que sobre videogame, com uma naturalidade que me excitou. Suas roupas largadas pelo chão... eu teria aqueles dois! Fiquei paralisada por um instante, quis sentar no colo do meu namorado, mas quem estava mais duro era o tal amigo. Pau bonito e, talvez por estar depilado, parecia maior que o do Steve. Fui até a geladeira pra me recompor e pensar no que fazer, e quando me abaixei pra pegar qualquer coisa, Steve chegou por trás e me pegou pela cintura... só aí senti a excitação dele.
— Steve, é seu namorado...? - perguntou a Lebre Maluca, se abanando de leve. Já Lola estava de braços cruzados, encostada, desinteressada.
— Sim, sim. Meu ex... - ela vacilou, até continuar: Ele me deu um beijo tão caloroso que perdi o fôlego, me deixou acesa, pronta para tudo. Aí me trouxe de volta pra sala, pro nosso convidado. Que era o Jason, esse babaca que espancamos hoje!
— Porra Branquinha, sério? Mas o que houve afinal?
— Nos poupe dos detalhes. - rosnou Lola.
— Bom, encurtando a história... tenho um fetiche por barbas. Steve passou a cultivar barba por mim. Eu uso cremes nela, aparo, cuido, já fiz tranças... De uns tempos pra cá minha fixação pela barba dele aumentou. Noite dessas estávamos no sofá comendo alguma gordice e assistindo séries quando reparei na barba toda melecada dele. Acho que era leite condensado, aquilo me enlouqueceu de um jeito, sabe? Montei no pau, apressada, já toda encharcada, e gozei rebolando enquanto lambia a barba dele.
A Coelhinha da Playboy soltou um muxoxo de nojinho, no que foi acompanhada por Lola. Roger "Pernalonga" e a Lebre Maluca riam, nervosas.
— Como assim amiga?
— Foi um tesão inexplicável. Aquela noite virei de fato a puta dele. Até beijo grego fiz, coisa que sempre me recusei. Deixei ele comer meu rabo, foder minha garganta, me enforcar, dar tapa na minha cara... deixei tudo!
A Lebre suspirou ao seu lado.
— Bom, quando estávamos com o carinha lá, num momento de loucura, eu quis que ele gozasse na barba do Steve pra eu lamber.
Todas na mesa engasgaram com as bebidas ao mesmo tempo. "Quê???"
— É, eu sei, eu sabia. Vocês tem nojo, não entenderiam minha tara.
— Ninguém aqui tem nojo de porra, Branquinha - retrucou Lola - São os próprios machos que tem. Quando gozam na minha boca nem me beijam depois. E é a porra deles mesmos!
— Verdade. A tal masculinidade frágil, né?
— Mas termina de contar, o que houve?
— Tava tudo tão bom que senti que podia rolar qualquer coisa, mas tava enganada. Eu falei em voz alta essa minha vontade, enquanto eles me comiam. Steve riu, nervoso, mas algo em seu olhar dizia que toparia. Só que nosso parceiro parou na hora de me enrabar. Ele saiu de mim, perguntando se o Steve era gay. Gritou que não suportava gay, e partiu pra cima do meu namorado. Saíram na mão, meninas!
— E você?
— Eu congelei. Antes mesmo de raciocinar qualquer coisa, o cara já tinha acertado dois socos que derrubaram Steve. Caiu por cima dele, socando ainda mais. Deu umas cotoveladas de UFC na cabeça, sabe? De repente vi que tinha sangue na barba do Steve. Do olho, da boca, sei lá. O cara tava quebrando ele na porrada e eu nem sabia o que fazer!
— Que aflição, mana!
— Quando fui tentar separar, ele me jogou longe. Caí, bati a cabeça e fiquei muuuuuuito tonta. Acho que por causa das bebidas também. Sei que ele tava gostando de bater no Steve. Vi quando se levantou, pelado, depois de espancar meu namorado. Ainda estava de pau duro.
— Que filho da puta!
— Batemos foi pouco nele. Que ódio desse cara!
— Acho que estourei as bolas dele no chute. Tomara. - finalizou a Coelho Branco, engolindo o resto de bebida do seu copo.
— Que bom que agora temos umas às outras para dar o troco nesses escrotos.
— Enquanto a loucura de vocês for parecida com a minha, estarei aqui. - respondeu a Coelhinha da Playboy, abraçando e acalentando a pequena albina.
— Essa coisa de "Coelhas", as máscaras, quem inventou isso? - quis saber Lola, a última que tinha entrado no grupo.
— A Lebre que sugeriu. Disse que máscaras de coelhos podem ser fofas e bizarras ao mesmo tempo. Como nós. - respondeu a Coelhinha da Playboy.
— E também tinha um cara que vivia postando um vídeo de um cara fantasiado de coelho gigante batendo nas pessoas na rua. "O coelho da páscoa te odeia", algo assim. Ele repostava toda páscoa, e eu sempre ria vendo aquilo. - completou a Lebre.
— E por que você escolheu esse codinome, "Coelhinha da Playboy"?
— Lola, você nunca viu a foto dela fantasiada assim? Deve ter passado de 300 mil curtidas.
— 372 mil, na verdade. Eu gosto desse codinome. Outra escolha excelente da Lebre, ela nos batizou todas.
Elas só se reuniriam novamente uma semana depois. Todas com roupas confortáveis, exceto Pernalonga, que fazia questão de ostentar suas enormes botas brilhantes. "São armas, na verdade".
— Aliás, onde comprou essas? São lindas! - quis saber a Coelhinha.
— Uma amiga minha conhece um cara da noite chamado "Senhor das bonecas", parece que ele tem uma loja privada. Ela que conseguiu essas para mim, são exclusivas.
— Eu quero, preciso. Fale com sua amiga. Preço não é problema.
— Então, parece que não se paga com dinheiro. Ela me disse brincando que lhe custou a dignidade, mas o olhar dela dizia outra coisa.
— Que papo estranho, Roger.
— Mas me conta, o que tem nas sacolas?
— Nossas máscaras e armas. Não vamos assustar o moço logo de cara, né?
O "moço" - um motorista de aplicativo - virou a esquina da Catedral de Nossa Senhora com seu veículo espaçoso e potente. Um apaixonado por carros, diferente das meninas que nem sabiam dizer qual modelo era aquele.
— Oi! - ele desceu o vidro automático medindo cada uma delas - Vão todas vocês? Não cabem cinco passageiras no carro.
— Ah, por favor, a gente se espreme ou vai no colo uma da outra, a gente dá um jeito.
— Bom, é que posso ser multado, né?
— A gente faz caminho alternativo por dentro, e não contamos a ninguém se você não contar.
— Somos boa companhia, moço. - disse a Coelho Branco, caprichando no sorriso. Pernalonga, sem esperar resposta, abriu a porta e sentou-se ao lado dele.
— Você é grande, né? - comentou o motorista, contrariado - Tá, tá bom. Ajeitem-se aí no banco.
Lola entrou primeiro. Sentou-se bem atrás dele, contendo todo seu ódio. Depois entrou a loiríssima Coelhinha. Coelho Branco, pequenina, sentou no colo dela. Lebre Maluca entrou por último e fechou a porta com dificuldade.
— Tudo certo aí? - ele inspecionou pelo retrovisor. Não conseguia vê-las todas, mas o decote da mocinha no colo era bonitinho. Olhou para trás para enxergar enfim aquelas coxas grossas apertadas pelo short, branquinhas como leite.
— Podemos ir, Robert. Robert seu nome, certo? - perguntou Pernalonga, séria.
— Sim, igual está no aplicativo. - ele reparou enfim que a passageira compridona ao seu lado era trans.
— Bom que você usa essa mesma foto em todos os lugares. - disse Lebre Maluca, lá atrás.
— Como assim? - ele manobrava o volante de maneira tensa.
— Ah, em suas Redes Sociais. A gente nunca sabe se motorista de aplicativo é confiável, sabe?
— Ah, sim, sei sim. Vida de mulher é complicada, né? Em perigo o tempo todo... na defensiva.
— Você é confiável, Robert? - novamente, Pernalonga.
— Sim, pode ver que tenho nota alta no aplicativo, sou VIP e...
— Não falamos de notas, estamos falando de intenções. - falou Lola pela primeira vez, a voz carregada de irritação - Nota de aplicativo não garante nada.
— É que uma amiga nossa foi... violada... num carro desses, moço. - começou a albina, que se esticou, para falar mais próxima do ouvido dele.
— Violada? O que significa isso? É que hoje é tudo tão... sei lá. Você não pode mais dizer que uma mulher é bonita que dizem que é assédio.
— Ela quase foi estuprada, só por dizer que não queria.
Robert tentou ver quem estava sentada atrás dele, mas a moça se desviava dos retrovisores, escondida dos ângulos.
— Você não é desse tipo, né? Já tentou assediar alguma passageira?
— Eu? Não! Jamais, isso aqui é meu ganha-pão. Sem isso eu...
— Nem passageira bêbada? Ou com roupa muito justa?
— Olha, eu sou homem, tá? No máximo eu olho, se a mulher é simpática eu elogio, mas não passa disso.
— E quando ela te diz não, Robert?
O motorista se calou, fazendo uma curva muito aberta, suando frio. Quando olhou para o retrovisor de novo, todas estavam colocando máscaras esquisitas de coelho.
— Obrigada por usar a mesma foto em todas suas redes, otário. - lhe disse a gordinha sentada à porta, por baixo de uma máscara branca de couro, com orelhas pontudas e rosáceas projetadas para os lados. Seu nariz também era rosa, e no lugar de olhos e boca, círculos cheios de furinhos.
— Foi assim que a Lebre Maluca conseguiu rastrear você certinho e te atrair para essa corrida. - disse a branquinha ainda no colo.
— Que isso? É um assalto? Eu não tenho dinheiro vivo, eu...
Pernalonga usava uma máscara pink enorme de PVC. O encarou por detrás dela e ordenou:
— Quieto, entre na próxima à esquerda e vá até o final. Sabe por que sentei aqui na frente, Robert?
Ele negou com a cabeça, as mãos crispadas no volante. Um animal cercado.
— Porque sou trans, e acho que você não teria coragem de passar a mão na minha coxa.
— Quê? Eu nunca...
— Eu sei que você passou a mão na perna de uma amiga minha, mês passado. E eu vi como olha para as coxas da Coelho Branco aqui.
— Não, espera, eu...
— Calaboca escroto, você não fala. Agora você só escuta. - rosnou Lola.
— Olha moças, acho que estão me confundindo com...
— VOCÊ perguntou se eu namorava. VOCÊ desligou o trajeto do aplicativo tarde da noite e me chamou pra ir pra outro lugar "curtir", seu merda! VOCÊ me chamou de "gostosona" e disse que tava de pau duro, seu tarado imbecil. VOCÊ falou todas essas coisas e colocou a mão na minha coxa, seu...
Só então Robert percebeu quem estava sentada exatamente atrás dele, agora escondida atrás de uma máscara simples, preta com pontos prateados brilhantes, que lhe cobria toda a metade superior do rosto. A coelha tinha um anel rosa espalhafatoso no dedo anelar da mão esquerda. Sentiu uma vibração forte quando ela aproximou aquilo do pescoço dele.
— A gente não ia bater nesse assediador? - perguntou a Lebre Maluca.
— Que você acha, Robert? Você merece apanhar? Em nosso lugar, que faria?
— Desculpa, desculpa, desculpa...
— Olha aí Lola... o grande macho predador que te assediou tá chorando, pedindo desculpas. Tá satisfeita?
O motorista virou-se, receoso. Tinha o olhar traiçoeiro de um rato acuado, pronto para reagir e morder.
— Vai assediar novamente alguma passageira, Robert? - gritou Lola - Vai continuar esse motorista babaca e medíocre, que não honra nem o próprio ganha-pão? Vira gente! Guarda esse pau dentro da calça, seu filho da puta!
— Eu sei o que está tentando fazer, gritando comigo para ver se reajo. Não vou reagir. Sou um homem bom, pai de família. Não sou assim, não vai acontecer de novo, prometo a vocês. Preciso desse trabalho.
Coelhinha da Playboy sabia o que as meninas fariam depois. O combinado era não demonstrar fraqueza nem piedade nunca, jamais vacilar diante dos homens, então permaneceu quieta enquanto a Lebre tirava um taco de beisebol da sacola.
— Você parece arrependido... mas não por respeitar as passageiras. Você tá é com medo da gente te denunciar nesse aplicativo de merda. - disse calmamente a pequena Coelho Branco no colo. Então pegou o taco da amiga e afundou a ponta dele no celular de Robert que estava fixo no painel, com o aplicativo aberto. Quebrou na hora.
— EI!
Pernalonga aproveitou a explosão dele e, virada como estava, acertou um soco com toda a força do seu braço direito, que entrou potente na cara de Robert. Escutou o barulho de dentes quebrando e sentiu dor nas articulações por encaixar a porrada no maxilar dele. Antes que ele pudesse reagir, Lola encostou o anel e liberou toda a carga elétrica no pescoço. O homem estrebuchou e desmaiou.
— Você é a maior finalizadora de homens que conheço. - riu a Coelhinha da Playboy, tirando alguns lacres da sua sacola - Aqui, vamos prendê-lo no volante com esses enforca-gato.
— Lebre, estamos seguras nesse lugar? Não tem câmeras mesmo né?
— Fiquem tranquilas, meninas. Nenhuma, desde a avenida. E mesmo lá a gente tava misturada no trânsito.
— Vão conseguir te rastrear pelo aplicativo?
— Garanto que não.
— Então vamos colocar esse otário no porta-malas. Perdeu o celular, uns dentes, vai ficar com a cara roxa uns dias. Digamos que tomou um "choque de realidade". Querem aprontar algo mais com ele?
— Com ele não. Vamos arrepiar o carro logo e sair daqui. Quero virar essa página da minha vida. Obrigada, manas!
Robert foi encontrado muitas horas depois, amarrado dentro do porta-malas do veículo. Riscaram fundo "assediador" em cada uma das portas e vidros, amassaram toda a lataria; pneus e bancos rasgados. As lanternas, os faróis todos quebrados, retrovisores arrancados com pauladas. Para a polícia ele disse que tinha sido abordado por três homens e chorou ao perceber o tamanho de seu prejuízo...
— Meninas, estamos bem até aqui? Duas vinganças já e hoje teremos a...
— Eu quero falar. - interrompeu a Coelhinha da Playboy.
— Sim, amiga, claro.
— Eu nunca me senti tão acolhida e segura como agora, com vocês. Guardei essa dor dentro de mim por muito tempo. É horrível ter sido violada, sem ter a certeza criminal de ter sido mesmo. Vocês não me julgarão. Eu fui muito, muito, MUITO julgada mesmo, até pela minha família, quando tentei resolver isso nos tribunais.
— Conta com a gente nessa.
— Meu primeiro namorado, ele... Ele era independente, já morava sozinho numa casa enorme, eu adorava estar lá com ele, era deslumbrada, sabem? - ela deu um risinho nervoso, soluçante, os olhos marejando pelas lembranças - Só que tinha uma turma que também frequentava lá para beber, jogar cartas e videogame. Eram todos grosseiros, asquerosos mesmo. Eu sabia lidar bem com eles, até aquela noite.
— Ai, não... - choramingou a Coelho Branco.
— Eram seis, jogando, bebendo e se ofendendo de maneira chula, ridícula. Xingavam as mães dos outros, um horror. Meu ex, talvez por eu estar ali, só bebia e gargalhava. Seis crianções alcoolizados largados pelo carpete da sala.
— É assim que machos se divertem. Tem uns que apostam o cu nessas jogatinas. - resmungou Lola tentando, de seu jeito torto, diminuir a tensão da conversa.
— Certa hora da madrugada eu me deitei no colo do meu ex. E alguns minutos depois percebi que estava todo mundo capotado no chão, alguns já roncando. Meu ex deitou por último, se encaixando em mim e eu adormeci.
Todas se entreolharam, cabisbaixas, esperando pelo pior da narrativa.
— Eu tenho sono muito pesado, brinco que posso dormir num show de rock. E sei que posso mesmo, já aconteceu. Então, quando senti o volume duro ali atrás de mim e a mão apertando meu seio, eu demorei pra processar, deixei a outra mão descer e se enfiar na minha calcinha. Amo acordar com sexo, meu ex sabia disso. Eu só coloquei a mão pra trás, peguei o pau e me ajeitei pra recebê-lo. Entrou rápido, eu tava mais molhada do que acordada. Ele bombou algumas vezes e se acabou rápido, um minuto, pouco mais que isso.
— Homem bêbado, né? - desdenhou a Lebre.
— Sim. Cutucar minha menininha logo cedo me deu vontade de fazer xixi, e eu me levantei. Fui ao banheiro. Só que quando eu saí vi a cena mais bizarra da minha vida até hoje: meu ex passa pelo corredor todo arrumado, com um copo da Starbucks na mão e meu nome escrito nele. Eu paralisei na hora, e eu relembro essa cena quase todos os dias em câmera lenta!
— Esperaí, quem...?
— Eu voltei correndo pra sala, e quem tava deitado lá era um dos moleques, com o pau molenga ainda pra fora, respingando na virilha sabe? Os outros quatro ainda dormiam, mas esse filho da puta estava rindo... RINDO! Eu desenvolvi um nojo IMENSO de homens, vocês não fazem ideia!
— Posso imaginar, mana... - murmurou Lola, resumindo o sentimento das ouvintes, que estavam todas com as mãos na boca, incrédulas.
— Voltei correndo pra cozinha e meu ex tentou me entregar o copo: "Olha, trouxe do jeito que gosta."
— Que cara mais sem noção!
— Eu gritei, BERREI por ele ter me deixado sozinha e ele apenas respondeu: "Ué, eu te deixei com os caras, eles são gente boa, demorei dez minutinhos só, qual o problema?"
— Meu Deus, querida...
— Eu parti pra cima dele furiosa, falei que tinha sido violada e ele continuou com a cara de incrédulo, ainda com a porra do copo na mão. Só esboçou reação quando o tal amigo dele chegou na cozinha rindo igual uma hiena, uma mancha molhada no calção.
— E o que ele fez?
— Saiu de casa, nervoso, batendo a porta. Nos deixou lá! Não confrontou o amigo, não falou nada, nem com ele, nem comigo. Não perguntou nada, só abandonou a casa. Eu me vesti e saí logo atrás, só fui revê-los de novo muito tempo depois no tribunal. A hiena risonha foi inocentada, pois segundo o juiz não houve estupro, já que eu PEGUEI NO PAU DAQUELE FILHO DA PUTA e coloquei em mim... Que ódio! - a "Coelhinha da Playboy", uma influenciadora digital linda, maravilhosa, poderosíssima, praticamente uma Vênus da beleza, se desmanchava em mil pedaços diante delas, chorando de maneira quase convulsiva.
As Coelhas todas se abraçaram, solidárias. Ninguém conseguiu falar nada, palavra alguma ajudaria naquele momento. Só depois de muito silêncio é que ela voltou a falar:
— Imaginem contar diante de um júri que estive numa casa sozinha com seis homens bebendo. Me questionaram se eu bebi, o quê e quanto, qual era minha roupa na ocasião, o que eu estava fazendo lá e PASMEM: Como eu não tinha percebido que não era meu ex me penetrando? A minha ex sogra chegou a me dizer que eu deveria saber diferenciar assim que entrou em mim! Minha própria mãe me disse isso, só que com outras palavras...
— Fica tranquila mana. Já que a justiça falhou, vamos nós mesmas tirar o sorrisinho da cara dessa hiena! Qual o nome do palhaço?
— Michael. Eu e a Lebre já armamos todo um esquema pra pegarmos esse desgraçado via aplicativo de foda. A inteligência não é o forte dele. Pensa com o pau, igual ao otário do Jason.
— Vamos logo que ele tá aqui implorando, mandando mensagem a cada cinco minutos dizendo que estará sozinho em casa a noite toda.
— Relaxa a bundinha, seu filho da puta, RELAXA! - gritou a máscara orelhuda de PVC com as cores do arco-íris. Por dentro dela, o olhar irado da Pernalonga, uma figura alta, toda tatuada, metida num corpete e botas enormes.
Michael, amordaçado e com os pulsos presos com enforca-gatos, se debatia e lutava para que ela não erguesse seus tornozelos, também atados.
— Dá uma amaciada nele, Lebre. Dá umas pauladas nesse merdinha pra ele aprender.
A Lebre Maluca gira seu taco e acerta duas pancadas fortes nas coxas dele; a primeira o força a se contorcer pro outro lado, onde ela bate novamente. Ele se encolhe com a dor, e suas lágrimas parecem arder ainda mais os olhos irritados pelo spray.
Coelhinha da Playboy assiste a tudo, afastada. Tem uma cenoura enorme, brilhante, na mão, que ela aperta com raiva durante todo o espancamento daquela hiena maldita. Ela deu o primeiro choque nele, que o atordoou até ser dominado pelas outras Coelhas. Estavam juntas exorcizando o demônio que a atormentou por tanto tempo. No quarto tinha uma foto dos pais dele, os mesmos que a acusaram de querer "corromper" um pobre garoto bêbado que só queria se divertir jogando com os amigos. "Eu vou traumatizar seu filho, papai."
— Escuta bem, seu merda, eu vou enfiar isso aqui em você. Olha aqui o tamanho, ó. Sem camisinha! - ameaçava Pernalonga.
Ele chacoalhava a cabeça freneticamente, piscando com o ardor nos olhos, e só conseguia responder com gritos abafados.
— Isso é para cada mulher que você já desrespeitou por aí. Em especial uma amiga nossa que você se enfiou sem a permissão dela. Agora vamos socar essa porra em você sem sua permissão também!
— Segurem ele, vamos ver até onde a masculinidade dele vai!
Michael foi virado de bruços, gritando. Lutou até onde conseguiu, levando choques a cada movimento que tentava. Não era muito forte, aos poucos sua musculatura não conseguia mais resistir. Lebre Maluca sentou-se pesadamente em suas costas, e a Coelho Branco puxou fora seu calção e cueca juntos. Ele tentava protestar sem conseguir.
— Cada uma segure um tornozelo do puto. Já lubrificou a cenoura, Coelhinha?
Sim, ela já tinha despejado quase todo o tubo de lubrificante e esfregado aquela casca alaranjada e rugosa inteira.
— Minha mão está muito escorregadia... Você faz, Pernalonga?
— Claro, dá aqui.
Michael, que até então estava quieto, recomeça a se debater quando sente aquilo o invadindo, escorregando para dentro.
— Não tranca a bunda não, filho da puta! Não tranca não, que se isso quebrar dentro de você nós te desovamos no estacionamento do Hospital Geral!
— Aí todo mundo vai saber o putinho que você é. - disse a Branquinha, que estava ajoelhada em cima da panturrilha esquerda dele, ajudando na imobilização.
Coelhinha da Playboy agachou-se diante do homem, queria sorrir para o sofrimento dele. Testemunhar cada revirada daqueles olhos chorosos, cada contração facial, cada berro abafado enquanto a cenoura avançava dentro dele, centímetro por centímetro. E sorriu muito, mas não de satisfação, como imaginou.
Aquilo que sorria agora... ela nem sabia que existia dentro dela.
— Existe a possibilidade dele estar gostando... e ficar se debatendo só para disfarçar? - riu Lola, que segurava o outro tornozelo.
— Quanto tempo vocês acham que a gente deixa aí dentro?
— Pode tirar, ele aprendeu a lição. E, caso não aprenda, a gente volta. - falou Coelhinha da Playboy, de maneira seca, levantando-se. Deu as costas para o maior fantasma da sua vida, que agora estava alquebrado, ofegante, no chão. Derrotado. Violado.
Aces High Bar, horas depois:
— Por mim eu teria deixado ele amarrado e com a cenoura lá dentro. Vocês foram boazinhas demais! - resmungou Lola, bebendo sua segunda cerveja.
— Perigoso, ele poderia se machucar sozinho. Não é para matar o cara, só vingar e assustar. Acho que passamos bem o recado. Amanhã vão achá-lo e soltam os pulsos dele.
— Foi poético, tinham cinco rapazes quando aconteceu aquilo com a nossa Coelhinha, hoje fomos cinco meninas contra ele. - arrematou Lebre Maluca.
— Hã, meninas... eu... eu não vou continuar com vocês.
— Quê? Mas por quê?
— Olha... foi bom pra mim ver aquele imbecil ali no chão, poder rir do desnorteamento dele. Devolver quase na mesma moeda, mas eu acho que exagerei. Não me senti bem, estou me sentindo suja até agora, na verdade. Não sei se foi justiça, não sei se foi certo.
— Suja...?
— Deixa ela falar. - interrompeu Lola, erguendo a mão.
— Desculpem, não quero parecer ingrata. Eu que planejei, vocês só me ajudaram. Obrigada, de coração, mas...
— Mas...? - Pernalonga era a mais impaciente das Coelhas.
— Mas eu não posso mais. Não consigo fazer isso de novo, com ninguém. Por favor, me entendam e me desculpem. - ela soluçou e quis se levantar da mesa.
— Ei, ei. - Coelho Branco colocou a mão no ombro dela - Calma, está tudo bem. Não corra da gente, nós entendemos.
— Não é, meninas? - continuou a pequena albina, em tom conciliador, olhando para as outras três.
— Sente-se. - continuou Lola, coçando a cabeça com nervosismo. - Vamos bebemorar que esse escroto caiu, e depois você segue sua vida.
— Eu não posso comemorar uma coisa dessas, gente. Achei horrível o que fizemos - DESCULPE! - o que EU fiz. Eu só quero ir embora e... Só. Ok?
— Deixa ela. - resmungou Pernalonga. Virou de costas para a mesa, cruzando as pernas enormes.
Coelhinha da Playboy beijou a testa da Branquinha, deu um beijo na bochecha da Lebre Maluca e segurou a mão de Lola como se estivesse pegando num peixe morto. Agradeceu com o olhar triste e saiu, para nunca mais voltar.
— O que foi isso? - quis saber Lola.
— Ela exagerou mesmo. - comentou Coelho Branco - Acho que traumatizamos aquele rapaz para sempre.
— E ela não vive esse trauma desde que aconteceu? Eu achei foi pouco!
— Meninas - Pernalonga volta-se para a mesa - O que nos une é que resolvemos transformar nossa dor em enfrentamento. Quero saber de quem está aqui: estamos juntas até o fim?
— Claro! Eu e a Branquinha já tivemos nossas vinganças, nem por isso sairemos, vamos até o fim!
— Exato. Tô com a Lola, sempre. - respondeu a Coelho Branco.
— Eu estou com vocês, com ou sem cenoura. - disse a Lebre, erguendo a long neck para todas brindarem a união.
Uma semana depois, as Coelhas restantes se reuniram novamente. No final de noite, enquanto todas as pessoas normais dormiam pela cidade, elas estavam as quatro dentro do carro, rodando por Sistinas. O alvo delas curtia o Cave Canem, balada que estava bem famosa nos últimos tempos.
— Todas as últimas atualizações de status dele são lá de dentro, aquelas malditas filmagens com áudio estourado que todo imbecil posta.
— Caramba Lebre, você é muito hacker mesmo. Como achou o perfil do cara?
— Na noite que ele espancou Pernalonga também fez postagens. Eu o encontrei por hashtags e check-in. Peguei todos que achei e mostrei para ela. Uns 35, 40 perfis né amiga?
— Sim e ele tava nesse meio, seu nome é James.
— Ainda bem, senão seria mais difícil de achar...
— Bom, vamos circular o quarteirão até ele sair. Espero que tenhamos uma oportunidade, senão só semana que vem.
— Olha, estamos com sorte, acho que é ele ali. - apontou a Coelho Branco no volante.
— Parece... - Pernalonga estreitou o olhar faiscante de ódio para enxergar melhor. - É ele sim! Vai pra cima desse puto!
— Calma, aqui tem muita gente. Sabe se ele tem carro ou vai chamar por aplicativo?
— Na noite que saímos do Cave Canem juntos, fomos caminhando por um beco lateral lá do outro lado. Foi lá que ele aproveitou e me espancou.
— Roger, preciso te perguntar isso: como ele te bateu? Desculpe, mas... você é alto e forte por ser... você sabe, trans. Você não conseguiu enfrentá-lo? - perguntou a Branquinha.
— Não, ele é do meu tamanho e foi covarde, traiçoeiro mesmo. E depois que você leva o primeiro soco fica complicado revidar e igualar. Eu não esperava, ele se mostrou interessado em mim, elogiou minhas pernas, eu tinha bebido bastante e quis sair com ele. Foi quando... droga, deixa quieto, só quero bater MUITO nele.
— Bom, acho que nós juntas damos conta dele, né? Pois o covarde tá indo pra lá agora mesmo.
— Homem não tem problema em andar sozinho na rua, né? Até abusam da sorte.
— Eu quero moer esse palhaço na porrada. Vai! - gritou Lola no banco de trás, girando o bastão de choque nas mãos, puta da vida.
— Coloquem as máscaras. - disse Pernalonga, embriagada com o sabor da vingança.
James escutou uma porta de carro batendo atrás de si e, bêbado, quase sem reação, se voltou devagar. Viu quatro vultos orelhudos na escuridão do beco correndo pra cima dele. Lentamente começou a rir, sem saber o que era aquilo. Levou um soco forte na boca, tão forte que sua cabeça virou inteira pra trás e voltou. Então caiu, vomitando todo sua consumação na balada, com sangue e dentes.
— Mas, mas... PÉRA PÁRA PORRA! Que isso, caralho? - resmungou ainda encurvado no chão, tentando se erguer.
— Tá vendo essas pernas aqui, seu merda? Medem UM METRO e seis centímetros cada, foram feitas para chutar macho escroto, são meus cartões de visita!
Sua bota enorme brilhou, encaixando-se violentamente na boca de James. Mais dentes quebraram. As sombras projetadas nas paredes do beco distorciam em coelhos enormes dando pontapés no homem caído numa poça de água suja, vômito, sangue e a própria urina. Depois de muitos chutes, as quatro pararam para ver o estado dele. James tentou agarrar as canelas da Coelho Branco nesse momento, mas ela borrifou o spray de pimenta nele e se afastou.
— Frita ele, Lola.
Lola encostou o bastão no peito do homem que esfregava o rosto, chorando e gritando:
— Você se acha bastante macho batendo em mulheres, né seu merdão? Agora taí todo molhado no próprio mijo, imbecil.
Então ela acionou o botão e o manteve apertado até a descarga elétrica apagar James.
— Nem precisava, Pernalonga. Ele acabou muito rápido. Esse merda nem apanhou direito.
— Até que apanhou sim, perdeu vários dentes. - Lola forçou o bastão no lábio superior machucado, levantando e expondo o estrago - Vai demorar para encher o saco de uma mana em balada.
— Meninas, ele tá... respirando? - perguntou a Branquinha.
— Deixa ele aí, caído. Foi desse jeito que ele me largou naquela noite. - interrompeu Roger, ainda suado e ofegante de tanto chutá-lo - Agora estou vingada, me sinto bem melhor!
Todas voltam para o carro, e a Coelho Branco tem um péssimo pressentimento enquanto gira o volante pra saírem dali.
O quarto é o maior cômodo da casa, pensado para ser muito aconchegante. A Lebre arrumou tudo para receber a visita de suas amigas Coelhas, até o leve aroma de incenso que perfumava o ar mesmo sem fumaça alguma aparente. Sua cama era grande e cheia de almofadas CTRL ALT DEL, outras em formato de hot dog, hamburguers, dinossauros, funkos e personagens de cultura pop.
— Às vezes, quando preciso de dinheiro, alugo esse quarto para camgirls que querem faturar em cima dos nerds endinheirados. - ela apontou para o espaço cujo destaque era a parede roxa ornada com um enorme pôster do Adam Warlock socando o Thanos, dois personagens icônicos das HQs. Thanos, aliás, tinha a mesma cor da parede.
— Quem é esse super herói dourado que não conheço?
— Ah, esse é o Adam, meu herói cósmico favorito. Vocês não conhecem pois não o colocaram no universo Marvel dos cinemas... ainda! - ela respondeu, com aquela mistura de exibicionismo com desconforto que todo geek sente quando explica uma de suas paixões. Ela gira e se acomoda na cadeira gamer ao lado da mesa branca onde fica seu notebook e abre o equipamento.
— Enquanto ligo tudo, peguem suas bebidas, meninas. - ela apontou para o canto de uma parede branca decorada com uma prateleira colorida em formato de peças de Tetris encaixadas. Embutido nela tinha um minibar retrô vermelho vivo, convidativo. Ao seu lado ficavam três cadeirinhas de madeira com assento também vermelho, desenhados como se fossem os cogumelos do jogo do Mario. O abajur ao lado da cama também era um cogumelo fofo do mesmo jogo. A luminária na mesa do "escritório-quarto" também era um personagem do jogo, o Chain Chomp dentuço contido por uma corrente flexível que direcionava a luz quando acesa. Os porta-canetas eram canos do encanador mais famoso do mundo.
— Podem sentar na cama se quiserem, é mais confortável. Fiquem à vontade, por favor. Vou exibir as câmeras no telão. - ela apontou um controle para o projetor bem acima da cabeça delas.
— Ques câmeras, Lebre?
— Gente... minha história é a seguinte. - ela começou cuidadosamente, pensando cada palavra - Eu fui pra cama com um homem casado.
— Ah não amiga, tanto homem livre por aí e você pegando embuste?
— Sem julgamentos, Lola. - disse Pernalonga enquanto abria uma cerveja pra Coelho Branco.
— Não gente, tudo bem. - continuou a Lebre - É que eu não acredito em pessoas comprometidas. Pra mim, monogamia leva à monotonia. É complicado para maioria entender mesmo.
— Ah sei não, e a mulher do cara, pensou nela? E a empatia?
— Lola, ser feliz envolve uma certa dose de egoísmo, e empatia tem limites. Você já ficou com namorado de amiga?
— Nunca!
— E com ex?
Lola vacilou na resposta: "É diferente..."
— Eu acho que você ficaria sem remorsos. - continuou a Lebre - Então, até onde vai essa sua empatia?
— Eu jamais seria amante de um cafajeste traidor. É humilhante demais, você fica com os restos.
— Eu não concordo com sua visão, Lola. - se intrometeu a Branquinha - Uma amante tem sempre o melhor do homem: atenção, carinho, desempenho, presentes...
— Sim, exato! Mas eu não quis ser amante. Peguei uma vez e tchau. Só beijo e sexo. Não muda nada, a pessoa não é minha e eu não sou da pessoa, entendeu? Só passamos um tempo juntos porque EU quis. - a Lebre percebeu que Lola continuava incomodada, então desatou a falar, sem dar tempo dela interromper de novo - E eu tava na minha, ele que veio me assediar, mesmo tendo uma esposa muito mais bonita e gostosa que eu. Isso mexeu comigo, com a minha estima, não nego. O foda é que o sexo nem foi tão bom quanto eu esperava e só me trouxe problemas depois. O cara não soube ser discreto e a esposa dele descobriu.
— Homem é tudo trouxa mesmo. - riu a Branquinha.
— Bom, aí que está o problema...
— Que houve... o cafajeste veio pra cima de você? Já até sei o roteiro, chamando a esposa de louca e...?
— Não. ELA veio pra cima de mim. Ela teve acesso a todos os nudes que trocamos, descobriu onde eu trabalhava e me expôs. Na época eu dava aulas de computação, ela de alguma maneira distribuiu as fotos entre meus alunos e eu fui demitida, depois de uma aula pra lá de constrangedora. Daí pra frente a comunidade tecnológica que eu fazia parte nunca mais me chamou pra meetups, nada. Vocês já viram do que sou capaz de fazer apenas tendo acesso à internet, mas por ter sido alvo desse golpe baixo eu perdi a autoridade que eu tinha em segurança da informação, que era outra fonte de renda minha, eu dava consultorias nessa área.
— Ela zuou bastante sua vida, hein? - comentou Pernalonga, cruzando as botas brilhantes.
— Sim, por isso hoje eu faço um monte de coisas pra me manter, desde gerenciar camgirls até criar sites pornográficos pra minerar criptomoedas em paralelo.
— Gerencia camgirls, que isso Lebre? Você é cafetina, porra? Explorando a sexualidade das manas e...
— Não fale sobre o que você não sabe, Lola! Não te devo satisfações, mas tirei muita menina explorada de estúdio pornô e fiz garotas de programa pararem de atender. Mostrei um jeito mais seguro delas explorarem o próprio corpo e com ganhos muito maiores! Elas são donas das próprias vidas agora, e minha grana tiro de serviços que faço pra elas ou do aluguel desse espaço aqui que estão vendo!
Lola baixou a cabeça e esfregou os cabelos crespos, suspirando, nervosa. Preferiu ficar quieta.
— Bom, estamos aqui pra assistir o troco. Meu troco! - continuou a Lebre, elevando a voz - Eu chamei um amigo meu, garoto de programa, pra seduzi-la. Peguei uma casa nesses sites de aluguel de temporada, sabe? Bom que é uma residência normal, ela pensa que ele mora lá. Paguei por três diárias, e ontem instalei várias câmeras. E hoje ele está lá, comendo ela onde eu disse que é pra comer, diante das lentes.
O telão estava dividido em 6 câmeras, eles estavam no sofá da sala, bebendo. Ele já estava sem camisa.
— Muito bonito o rapaz que você arranjou. - comentou a Branquinha.
— A Lori também achou. Veja como se esfregam. A filha da puta ganhou na loteria do sexo hoje. O marido dela, mesmo em seus melhores dias, não chega aos pés desse cara. - riu a Lebre, apontando com a latinha de cerveja erguida pro seu garoto na tela.
— A gente vai ficar assistindo essa tal Lori transar? Sério?
— Lola, o que você quer? Que a gente invada e bata nela, como fizemos em todas nossas vinganças até agora? É isso que quer? Espancá-la e dar choques?
— Não... mas na boa? Não vou ficar aqui vendo isso não. Estou fora!
— Quê?
— Não concordo com isso, ué. Temos que ter sororidade, nossa luta deveria ser contra os escrotos!
— Sua sororidade tem que ser COMIGO, Lola! COMIGO! Eu tenho direito a minha vingança, como todas vocês tiveram. Doa em quem doer!
— Pois aproveite sua vingança, Lebre. - Lola se levantou para deixar o quarto, a casa e as Coelhas - Eu não faço mais parte disso.
— Meninas, vamos conversar, resolver de maneira... - começou a Branquinha, coçando uma mão na outra, nervosa.
— Não! - interrompeu a Lebre - Agora sou eu que não quero mais ela aqui.
— Justo. Tchau meninas. Foi bom enquanto fomos irmãs.
Pernalonga deu um meio sorriso, sem jeito, e lançou um beijo. Já a Coelho Branco levantou-se, foi até ela e a abraçou forte. Depois Lola saiu, sem dizer mais nada.
Alguns minutos depois o telão exibia Lori ajoelhada, mamando o garoto de programa da Lebre.
— O pau dele é bem maior que o meu. - comentou Pernalonga, abrindo outra latinha de cerveja.
— Lebre, eu tô ficando excitada. Seu amigo é muito bonito. E que pica é essa?
— "Pica"? Quem ainda fala "pica", Branquinha? Acho que nem minha vó! - riu a Lebre - Esse cara... - ela engasgou num quase arroto, sorridente - Esse cara lindo me deve alguns favores. Eu tô excitada de saber que ele vai pagar cada um deles hoje, comendo essa vaca que me fodeu.
— Quero que venda seu corpo pra mim, gostosa. - dizia o garoto, no telão.
— Como assim? - perguntou Lori, ainda trabalhando com a boca.
— Quero que me diga porque eu devo comer você. Apresente seu corpo pra mim.
— Ah não, tenho vergonha...
— Tava mamando na rola igual uma bezerra faminta e agora tá com vergonha, safada? - gritou a Lebre, um misto de euforia e irritação. As outras Coelhas no quarto ficaram desconfortáveis com essa reação, mas pensaram que era só efeito das cervejas.
— Imagina, entra na fantasia. Pra eu te comer gostoso.
— Bem, minha vagina é apertadinha, raramente uso...
— "Vagina"? Acho que agora seu amigo broxa. - riu a Pernalonga.
— Que merda de brincadeira, eu não sei se curtiria não... - falou a Branquinha.
— Eu que pedi pra ele fazer isso, meninas. Quero gravá-la falando absurdos pra eu distribuir por aí, como ela fez comigo.
Lori, alheia ao fato que aquela foda complicaria sua vida, abocanhava com gosto enquanto apertava a bunda firme dele e forçava em sua direção. Corria as unhas naquela musculatura, sentindo seu clitóris inchar de tesão, desejando a penetração.
— Posso escrever coisas no seu corpo? O que eu poderia usar...? - ele fez uma pose de pensador, o pau enorme e duro balançando perto dela.
— Mmmm você é cheio de ideias, né seu safadinho? - ela gemeu, alcançando sua bolsa e tirando de lá um batom.
— Não vou fazer nada que você não queira, mas vou te provocar até você querer tudo.
— Escreve o que quiser, só não tira foto. Tenho vergonha. E minhas tatuagens me entregam fácil.
— Shhh, relaxa, isso é só entre nós. Fica de quatro, quero você soltinha. - ele ordenou, se posicionando por trás dela.
Lori estava, sim, se soltando, se permitindo ousar. Enquanto ele segurava sua cintura com a mão máscula, ela sentia seu sexo latejar de excitação. A calcinha umedecia a cada ideia estranha que ele propunha.
— Tô curiosa!
— Depois que a gente gozar vamos tomar uma ducha. Aí você olha no espelho e lê, ok? Mas agora é só pra eu ficar lendo, enquanto meto gostoso.
Ele escreveu "depósito de porra" nas costas dela. Até desenhou umas gotas, sorrindo.
— Gente, isso vai dar umas fotos SEN-SA-CIO-NAIS! - comemorou a Lebre, saltitando de alegria na cama. Pernalonga estava inquieta. A Branquinha ofegava, sem perceber, achando tudo aquilo baixo e excitante ao mesmo tempo.
— Mete logo, tô muito molhada garoto!
— Me dá uma camisinha, tem aí no criado-mudo.
— Quantas você come aqui, seu safado?
— Por dia? Não quer saber de verdade, quer?
— Quero. Me conta. Comeu outra hoje, antes de mim?
— Não, hoje minha porra é toda pra você.
— Me acha gostosa, atraente? Você tava me olhando na academia. Quer ser meu amante fixo?
— Você é muito atraente, sim, Lori. Agora deixa eu sentir como você é pra saber se é gostosa mesmo. Vem... rebola pra eu entrar.
— Eu... vou beber uma água lá na cozinha! - disse Pernalonga, levantando de repente, muito sem graça, incomodada. Ao seu lado a Coelho Branco suspirava fundo, os olhos grudados no telão.
— Tá tudo bem? - perguntou a Lebre, bebendo o restante da cerveja da garrafinha.
— Sim, sim... sim. - ele respondeu, só querendo sair dali.
— Volta logo. Durante o papai e mamãe ele vai dar uns beijinhos e escrever "puta" na testa dela. E depois eu pedi pra ele gozar no rosto dessa vaca.
— Porra Lebre, não divulgue essas imagens. Vai complicar a vida da mulher.
— Como ela complicou a minha. Que foi Roger? Vai dar uma de Lola agora? Até você?
— Onde é o banheiro, Lebre? - interrompeu a Branquinha, as maçãs do rosto super avermelhadas - Eu preciso jogar uma água no rosto. Seu amigo é... putaquepariu, seu amigo é muito gostoso... Olha a grossura dessas... coxas!
— Eu ajeito ele pra você, se quiser "conhecê-lo" por uma noite.
— Sério? Não estou entendendo vocês duas! - gritou Pernalonga - Isso não é... não é o que eu esperava quando começamos as Coelhas!
— Quer ir embora? - perguntou a Lebre, seca, abrindo outra cerveja.
— Eu vou!
— Tudo bem. Mais uma "irmã" que nega minha vingança. Tô lascada com amigas leais assim. - ela revirou os olhos com desdém, e no minuto seguinte as Coelhas perderam mais uma coelha.
Algumas semanas depois Pernalonga recebeu a visita da Coelho Branco. Não estava "montada" naquele dia, foi somente Roger quem abriu a porta.
— Oi amiga, tudo bem? - a Branquinha perguntou. Se estranhou o visual dele, não transpareceu.
— Sim, dentro do possível. E você?
— Fui visitar meu ex no hospital. A família dele me expulsou de lá. Acham que ele apanhou por minha culpa. - os olhos dela marejaram - Nem pude vê-lo, parece que o estado dele é grave, e...
Ela não terminou a frase, só ficou com os lábios tremendo e esfregando as mãos uma na outra. Pernalonga achou melhor mudar de assunto:
— O que traz você aqui?
— É outra coisa. - ela secou os olhos, quase rindo, se recompondo - Um assunto muito sério, muito triste, então preferi vir pessoalmente para conversarmos.
— Fala logo, Branquinha!
— A Lori... ela se suicidou.
— Putamerda...
— A Lebre cumpriu a vingança. Tirou fotos dela, gravou áudios, vídeos e mandou pra todos os amigos do trabalho, pra chefia, mandou pra turma da faculdade e da academia dela. A crueldade foi tamanha que ela mandou pros familiares também.
— Isso não se faz...
— Eu tô muito mal, Pernalonga. Eu fiquei tão interessada no garoto de programa lá que nem percebi o quanto aquilo era perverso. Eu só acordei do transe quando ele gozou no rosto dela. Esfregava o pau, rindo. Achei aquilo... sei lá. Eu deveria ter saído junto com você, me desculpe! Me sinto suja, culpada... é bem pior do que a Coelhinha da Playboy sentiu, agora entendo por que ela abandonou a gente.
— Você não tem culpa de nada disso. A única culpada é a Lebre!
Coelho Branco, com o olhar vago e anestesiado, parecia não ouvir. Apenas murmurou:
— Fomos coniventes, somos cúmplices... No que nos transformamos?
— Vamos até a casa da Lebre, aquela doida vai ouvir poucas e boas. Vamos!
Ambas permaneceram mudas durante todo o trajeto. Coelho Branco chorava ao volante. Duas, três grandes avenidas e vários bairros depois, elas param diante da toca da Lebre Maluca.
— É esquisito te ver assim, Roger. Quando está montada como mulher, aquelas botas... Você fica poderosa, uma diva. Assim, como homem, você é tão comum, sem graça, decepcionante... - debochou a Lebre, parada na porta segurando uma cerveja - Qual a ocasião? A última reunião das Coelhas?
— Ela SE MATOU! Satisfeita? - gritou Pernalonga, batendo a porta do carro.
— Um desfecho infeliz, mas o que posso fazer? Só prova que ela é mais fraca que eu. Ela fez exatamente o mesmo comigo, pegou todos meus nudes e mandou pra todos com a legenda "olha essa gorda que quer meu marido", me expôs pra todo mundo e eu continuei de pé. Já ela... - deu um gole na garrafinha, sem terminar a sentença.
— Sabe que isso é crime, não sabe?
— Do jeito que fiz, ninguém nunca irá descobrir. Usei diversos computadores anônimos que tenho em outros estados e países pra mandar o material, jamais vão chegar a mim. A própria família dela fez um pacto de silêncio.
— O marido sabe. Se ele te denunciar...
-Oh, sim, claro que sabe. Mas a família já sofreu tanto que a última coisa que ele vai querer pros filhos é um escândalo com amante envolvida. E ele tá bem agora, eu o libertei de um casamento infeliz.
— Que absurdo, como pode dizer isso?
— Segredo de amante. - continuou a Lebre - Mas se ainda assim ele for burro o suficiente pra me denunciar, eu torço um pouco a situação e ele pode até ser acusado de cumplicidade.
— Você pensou em tudo, né? - rosnou Pernalonga.
— Em cada detalhe, Roger. Vocês são as únicas pontas soltas, mas minha casa também tem câmeras, lembram? Coloquei câmeras e microfones em tudo, eu gravei cada ação nossa. Talvez até nas máscaras eu tenha colocado algo, quem sabe? Se me irritarem, eu entrego todo esse material pra polícia e acuso todas vocês. Agora saiam daqui!
Coelho Branco, que estava quieta demais, saiu da letargia e falou baixinho:
— Você não faria isso, somos amigas...
— Somos, Branquinha? Vocês TODAS me abandonaram!
— Acha que tenho medo de você? Eu vou te entregar, sua...
— Cuidado com a língua, Pernalonga. Sabe o James, o carinha que espancamos de volta? Sua vingança?
— O que aquele babaca tem a ver com o assunto?
— Ele morreu. Estava no chão molhado, todo ensopado, quando a Lola deu um choque muito forte nele. Teve uma parada cardíaca fatal. Vejam. - enquanto falava, sacou o celular do bolso e abriu um site de notícias. A matéria estava lá, e uma foto do corpo coberto naquele exato beco ilustrava o texto.
— Ai meu Deus... bem que reparei que ele não tava respirando! - chorou a Branquinha, desesperada.
Pernalonga desmoronou também e se calou.
— Agora, se me dão licença, ainda tenho muitas cervejas pra beber. Sumam daqui!
Roger abraçou a Coelho Branco e andaram até o carro. Ele pegou suas máscaras de Pernalonga - a pink e a outra multicolorida que ainda estavam no banco traseiro - e jogou ambas pela janela. Ao seu lado, ainda atordoada, a Branquinha apenas ligou o motor, engatou e acelerou, sem nem saber pra onde ir. Alguns metros depois, sua máscara de couro branco também voou pela janela.
E um carro passou por cima daquela máscara largada no asfalto, depois outro, outro e outro...
Comentários do autor
"Coelhas" nasceu de um pesadelo que tive com mulheres usando máscaras em novembro de 2016.
Eu não consegui colocar isso no conto, mas gostaria que ele terminasse ao som de Bitter Wine, das L7. Na minha cabeça Roger e Branquinha seguiram de carro escutando Donita Sparks cantar:
"Eu vou beber vinho amargo/Eu vou comer uma humilde torta/Eu vou fazer tudo isso/Por um pouco de paz/Eu vou fazer tudo isso pela tranquilidade da mente".